segunda-feira, 2 de março de 2015

Será preciso mesmo apagar a luz?*


Apagar a luz para melhor enxergar ou apagar a luz para não enxergar? Qual das duas alternativas serão mais compatíveis com o nosso papel existencial de autoconhecimento? Será preciso mesmo apagar a luz? O olhar para dentro deve ser distanciado do olhar para fora? Será que o entendimento da minha singularidade não reflete em como entenderei a singularidade do outro?

Essas questões estão inquietando minha alma há algum tempo. O estudo da filosofia clínica me fez entender que o que é bom ou suportável para minha singularidade pode não ser para a singularidade do outro. Mas, afinal, que outro? Ora, qualquer outro. Um partilhante, um amigo ou um amante. Talvez esse outro possa ser um familiar próximo, aquele que tento fazer com que seja àquilo que meu egoísmo acredita que seja melhor. Sim!!! Meu egoísmo. A vida não se apresenta da mesma forma para ninguém, somos singulares, graças a Deus. Minha experiência, vivência emocional, personalidade é singular e nunca plural por mais semelhanças que eu possa ter com outra singularidade. Isso é fato!!!

Então pode ser que, para “um outro”, seja de fato necessário apagar a luz para suportar "as dores e as delícias" da existência atual. Embora eu acredite que apagar a luz seja uma fuga momentânea, não tenho o direito de exigir que a luz seja acesa para ninguém. O meu direito termina onde começa o do outro. Essa célebre frase tem norteado minha existência... Muitos discordam e acreditam que poderiam, sim, retirar os véus da escuridão de “vários outros”. Mostrar ao outro que esses véus devam cair é muito delicado e requer muito cuidado, pois muitas vezes, o véu da escuridão pode ser a única esperança desse outro para suportar a existência. O universo particular de cada pessoa é tão sensível como o cristal, quebrável, e muitas vezes, impenetrável. Tentar agendar, qualquer que seja o termo, para o outro, requer um conhecimento prévio deste universo, muito bem pesquisado!!!

É preciso calma e sabedoria para viver e conviver com o outro, ainda que esse outro seja o seu outro "EU" que pode estar debaixo do véu da escuridão. Autoconhecimento é necessário, à medida que nos faz pessoas mais felizes e menos complicadas do ponto de vista existencial. E, claro, se quisermos, de fato, descomplicar nosso universo particular!!! Muitos afirmarão que é obvio que qualquer ser humano deseja ser feliz e viver de forma mais harmônica. Será? Devemos utilizar esse termo universal "qualquer ser humano"? E o que é felicidade? A interpretação da felicidade e de seu conceito varia, da mesma forma que varia a singularidade de cada ser humano. Não existe receita para a felicidade e para o bem viver, o que existem são tentativas pessoais e singulares.

Dentro de meu conhecimento de filosofia clínica, que ainda é muito pequeno, penso que cautela e respeito são fundamentais para qualquer filósofo clínico. Na verdade esses dois elementos facilitam muito a vivência e a convivência consigo e com o outro. Tenho vivido experiências maravilhosas com alguns adolescentes que são meus alunos, e por afinidade, tenho tido a oportunidade de estreitar minha relação com tais alunos. Sair do pedestal de professora e aproximar-me de meus alunos como apenas um ser humano é uma experiência incrível e apaixonante. Como aprendo com eles!!! A filosofia clínica se faz presente nesse momento de aproximação entre minha singularidade e a singularidade de cada aluno que se aproxima. E assim, vou caminhando e tentando perceber se devo ou não apagar ou acender a luz!

*Vanessa Ribeiro
Professora, atriz, dançarina e filósofa clínica.

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